A palavra Avatar, do sânscrito, tem um sentido metafísico: refere uma entidade que “baixa” na terra. Hoje, sua versão se atualiza na cibercultura e na realidade virtual do cinema 3D, tornando-se parte integrante do vocabulário das tribos plugadas nas artes tecnológicas do século XXI. E das mitologias de nossa hipermodernidade.
O filme Avatar (James Cameron), antes de qualquer coisa, é uma obra de arte – no gênero e sua potência estética e mitológica só encontra paralelos, em títulos como Metrópolis, Blade Runner e Matrix, cada um deles sendo uma referência fundamental para três gerações distintas de cinéfilos. Vejo Avatar para além do princípio da ficção científica e das ideologias de direita e esquerda. No contexto do grande painel pós-colonialista, além de ser um deleite para os olhos, a película registra uma semiótica de cunho político e ecológico bastante original. Primeiramente, desta vez, os humanóides é que são os invasores, bélicos, cruéis, predadores e após o aniquilamento do planeta Terra se aventuram numa odisséia pelo planeta Pandora, signo emblemático de uma mitologia antiga: a caixa de Pandora aberta traria de volta todos os males e infortúnios do mundo. Aqui se trata de uma metáfora do mundo natural (a floresta amazônica?) povoada por seres híbridos, em parte são clones dos humanóides, em parte são felinos, mas criaturas com formas humanas, peles azuladas e com dimensões gigantescas, lutando em defesa da vida, enquanto os humanos buscam colonizar o seu planeta (à procura de petróleo?).
O filme deve agradar tanto os teen agers quanto os seniors amantes do cinema, dos games, das HQ, das Grafic novels; porém, sua grandiosidade advém da extrema beleza visual e dos efeitos especiais, em 3D, postos a serviço de uma estória sublime, pois no centro da cena esta a Mãe Natureza, metaforizada pelo signo do ecossistema natural. Mesmo que, possa ser visto de maneira melodramáticas, como aliás o Titanic (outra obra de Cameron, o filme mais caro da história), Avatar demarca um matiz de afetividade, sinalizando a grandeza do amor nos tempos da cólera (amor entre os seres e amor à natureza).
Tem arrecadado bilhões de dólares no mundo inteiro (sabe-se que a indústria de Hollywood não brinca em serviço e deve arrebatar vários oscares); todavia, a sua força poética reside em colocar a tecnologia a serviço da expressão artística e não ao contrário. E convém atentar para uma pequena e importante diferença: Avatar parece se constituir num filme futurista, mas ele – sobretudo - atualiza (e antecipa) as sensações de todos nós pós-humanos imersos numa realidade virtualizada que nos fascina e nos assombra. Fala de segunda pele da cultura e seduz, principalmente, pela audivisibilidade de nossas representações (ou antes simulações), nossos desejos, medos, pedaços de horror e felicidade, em meio às máquinas de pensamento, de linguagem e de ação. Avatar é a expressão mais concreta de nossa outridade; arte e simulacro dos nossos sonhos e de nossas expectativas mais secretas.
Originalmente publicado no Correio da Paraíba, 08.01.2010
ResponderExcluir